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"Eu Me Mimei": O Ciclo do Prazer e da Insatisfação

  • flaviojrcontextuai
  • 5 de dez. de 2024
  • 4 min de leitura
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Você já ouviu alguém dizer "eu me mimei" ao justificar algo extravagante ou exagerado? Talvez tenha visto o exemplo recente da Virgínia Fonseca comprando uma bolsa de R$ 500 mil e explicando a escolha com essa frase. O "eu me mimei" virou quase um mantra nas redes sociais, usado tanto para celebrar conquistas quanto para aliviar a culpa por escolhas que, no fundo, parecem um pouco impulsivas.

Mas será que esse "mimo" traz mesmo a felicidade que esperamos? Ou será que ele acaba se evaporando rápido demais, nos deixando com aquela mesma sensação de vazio e a necessidade de buscar o próximo prazer?


A frase "eu me mimei" soa como algo leve e divertido, mas ela também reflete um comportamento profundamente enraizado no funcionamento do nosso cérebro. A seleção natural, que moldou nossos instintos ao longo de milhões de anos, tinha um objetivo claro: garantir nossa sobrevivência e reprodução. Ela fez isso nos "programando" para buscar prazer – mas com uma condição: o prazer não pode durar para sempre. Afinal, se um momento de satisfação fosse suficiente, ficaríamos parados, e o ciclo da vida cessaria.

Por isso, nosso cérebro nos recompensa com explosões de prazer quando alcançamos algo novo – seja uma bolsa de luxo ou um brigadeiro –, mas rapidamente retira essa sensação, nos deixando insatisfeitos e prontos para buscar mais. Parece cruel? Talvez. Mas do ponto de vista evolutivo, é brilhante.


O Ciclo do Prazer Efêmero

Vamos pegar dois exemplos para ilustrar esse ciclo:

  1. O Brigadeiro: Imagine que você está em um dia difícil e decide se mimar com um brigadeiro. Na primeira mordida, o cérebro libera dopamina, o neurotransmissor do prazer, e você sente aquele alívio imediato. Mas, ao terminar o doce, a satisfação desaparece. O que era prazer vira um vazio – e talvez você pegue outro brigadeiro, na tentativa de reviver aquela sensação inicial.

  2. A Bolsa de R$ 500 mil: No caso de Virgínia, a compra de uma bolsa tão cara pode até gerar um pico intenso de dopamina – a sensação de conquista, de recompensa. Mas, com o tempo, a novidade desaparece, e a bolsa passa a ser só mais um item no armário. O vazio retorna, e o ciclo recomeça: "o que será que vai me fazer feliz agora?"

Esses exemplos mostram como o prazer está mais relacionado à expectativa do que à experiência real. Quando finalmente conseguimos o que desejamos, a satisfação evapora rapidamente. E isso é exatamente como nosso cérebro foi projetado para funcionar.


A Ilusão da Satisfação Duradoura

O "eu me mimei" carrega consigo uma promessa implícita: a de que o prazer, seja ele um doce ou um luxo, será suficiente para preencher alguma lacuna emocional. Mas a realidade é que o prazer é sempre efêmero. A seleção natural nos programou para perseguir, mas nunca para alcançar uma felicidade permanente.

Mesmo a ciência confirma isso: quando estamos prestes a consumir algo desejado, como o brigadeiro ou a bolsa, a dopamina é liberada em maior quantidade antes do ato em si – na expectativa. É como se o cérebro nos enganasse, dizendo: "Vai ser incrível!". No entanto, na prática, o prazer nunca atende completamente às expectativas, e somos deixados querendo mais.


O Diagnóstico do Buda

Séculos antes de entendermos o papel da dopamina ou da seleção natural, o Budismo já descrevia essa condição. O Buda chamou isso de dukkha – a insatisfação inerente à vida. Ele observou que o prazer é passageiro e que o apego a ele nos mantém presos em um ciclo de desejo e sofrimento.

Então, quando dizemos "eu me mimei", estamos, na verdade, tentando lidar com esse ciclo. Não há problema em buscar o prazer – ele faz parte da vida. Mas é importante reconhecer que ele nunca será a solução definitiva para nossa insatisfação.


Como Romper o Ciclo

Saber que fomos "programados" para essa busca incessante pode nos ajudar a encarar o "eu me mimei" com mais consciência. Aqui estão algumas estratégias:

  1. Questione a Expectativa: Antes de se mimar, pergunte a si mesmo: "O que eu realmente estou buscando aqui? Alívio, conforto ou algo mais profundo?"

  2. Viva o Momento: Se decidir comer o brigadeiro ou comprar a bolsa, faça isso com atenção plena. Saboreie o momento sem expectativas irreais.

  3. Conecte-se a Propósitos Maiores: Em vez de buscar apenas prazeres momentâneos, invista em ações alinhadas aos seus valores, como criar, ajudar ou aprender algo novo.


"Eu Me Mimei" Como Reflexão

Dizer "eu me mimei" não precisa ser uma justificativa para impulsos ou excessos. Pode ser um momento de autocompaixão e até de autorreflexão. Quando Virgínia comprou a bolsa, ela provavelmente buscava algo mais profundo do que o próprio objeto: a sensação de merecimento, realização ou status. Assim como nós, quando buscamos um brigadeiro ou qualquer outro pequeno prazer.

Mas, ao entender que o prazer é sempre temporário, podemos aprender a nos mimar de forma mais consciente – sem a ilusão de que ele trará uma felicidade permanente. No final, o segredo pode estar menos em buscar o prazer e mais em encontrar significado no que permanece.


 
 
 

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